"Mas assim como o arqueólogo ergue as paredes do prédio a
partir dos alicerces que permaneceram de pé, determina o número e a posição das
colunas pelas depressões no chão e reconstrói as decorações e as pinturas
murais a partir dos restos encontrados nos escombros, assim também o analista
procede quando extrai suas inferências a partir dos fragmentos de lembranças,
das associações e do comportamento do sujeito da análise. Ambos possuem direito
indiscutido a reconstruir por meio da suplementação e da combinação dos restos
que sobreviveram. Ambos, ademais, estão sujeitos a muitas das mesmas
dificuldades e fontes de erro. Um dos mais melindrosos problemas com que se
defronta o arqueólogo é, notoriamente, a determinação da idade relativa de seus
achados, e se um objeto faz seu aparecimento em determinado nível, frequentemente
resta decidir se ele pertence a esse nível ou se foi carregado para o mesmo
devido a alguma perturbação subsequente. É fácil imaginar as dúvidas
correspondentes que surgem no caso das construções analíticas".
Literato por essência, Freud sempre
gostou das metáforas, como recurso para a compreensão da arquitetura psíquica.
Portanto ao pensar o trabalho do analista como um arqueólogo, faz com que esse
se assemelhe, não só a busca do conhecimento, da descoberta, do entendimento,
mas também da arte, pois sem uma escuta “fina”, estética, e porque não falar
com um “senso” de arte, pois o inconsciente possui uma tessitura que só um gênio,
fora da terra, poderia tê-la construído, não é possível aproximar-se dela. Mas percorrer os caminhos dessa
tessitura não pertence ao tempo. Saber de que tempo vem esse ou aquele fragmento
e a qual outro fragmento está vinculado, é tarefa de um não tempo.
FREUD, S.
- CONSTRUÇÕES EM ANÁLISE (1937)
- Obras Completas de Psicanálise -
volume XXIII Rio de Janeiro, Imago-1996.