21 de junho de 2017

Almas Similares:a-ma-ti-na-ta


Tu que lês meus pensamentos,
penetras em minh'alma,
conheces meus desejos, sonhos,
sabes da trajetória da minh'alma,
me amas incondicionalmente,
sabes tudo sobre mim,
me ver sem estares presente,
falas comigo pelo pensamento,
sabes sempre onde estou,
sabes sempre como estou,
lês minh'alma em meus olhos, em minh'alma,
minh'alma vibra ao ouvir teu nome,
falar teu nome enche minh'alma de amor,
sentes a vibração de minh'alma,
iluminado, sinto tua vibração,
tens a ingenuidade dos puros de coração
tua presença forte é um doce afago,
em minha trajetória,
teu toque em minh'alma
me transporta num não tempo,
vejo o invisível,
flutuo, unida a tua presença, em uma dança.
Quando penso em ti o mundo desaparece,
sensível, humilde, sábio,
com um sopro, cura minhas dores,
eis meu defensor e cavaleiro,
fiel, leal, devotado,
alma similar,
cavaleiro de Nosso Senhor,
um amor devotado a humanidade!

Myriam Maya

20 de junho de 2017

“Devemos nos tornar senhores dos sintomas e solucioná-los”...


“Só consideramos que uma análise esteja no seu término quando todas as obscuridades do caso tenham sido elucidadas, as lacunas da memória preenchidas, e descobertas as causas precipitantes das repressões. Os êxitos que assomam de imediato, consideramo-los mais obstáculos do que auxílio ao trabalho da análise; e pomos um fim a esses êxitos, resolvendo constantemente a transferência, na qual eles se baseiam. É essa última característica que constitui a diferença fundamental entre terapia analítica e terapia meramente sugestiva, e que livra os resultados da análise da suspeita de serem sucessos devido à sugestão. Em qualquer outro tipo de tratamento sugestivo, a transferência é cuidadosamente preservada e mantida intocada; na análise, a própria transferencial é sujeita a tratamento, e é dissecada em todas as formas sob as quais aparece. Ao final de um tratamento analítico, a transferência deve estar, ela mesma, totalmente resolvida; e se o sucesso então é obtido ou continua, ele não repousa na sugestão, mas sim no fato de, mediante a sugestão, haver-se conseguido superar as resistências internas e de haver-se efetuado uma modificação interna no paciente.”
“A aceitação de sugestões, em determinados pontos, é, sem dúvida, desestimulada pelo fato de que, durante o tratamento, estamos lutando incessantemente contra resistências capazes de transformar-se em transferências negativas (hostis). E não devemos deixar de assinalar que grande número de descobertas na análise, que de outro modo poderiam ser suspeitas de serem produtos da sugestão, confirmam-se, uma a uma, a partir de outra fonte irrepreensível. Nossos fiadores nesse caso são aqueles que sofrem de demência precoce e paranoia, os quais, naturalmente, estão acima de qualquer suspeita de serem influenciados pela sugestão. As traduções de símbolos e de fantasias, que esses pacientes nos apresentam, e que neles irromperam na consciência, coincidem fielmente com os resultados de nossas investigações acerca do inconsciente dos que apresentam neurose de transferência; e, assim, confirmam a correção objetiva de nossas interpretações, sobre a qual tantas vezes se lançam dúvidas. Penso que os senhores não se desorientarão se, nesses pontos, confiarem na análise.”
“Passo a completar minha descrição do mecanismo de cura, revestindo-o com as fórmulas da teoria da libido. Um neurótico é incapaz de aproveitar a vida e de ser eficiente — incapaz de aproveitar a vida porque sua libido não se dirige a nenhum objeto real, e incapaz de ser eficiente porque é obrigado a empregar grande quantidade de sua valiosa energia, a fim de manter sua libido sob repressão e a fim de repelir seus assaltos. Ele se tornaria sadio se o conflito entre seu ego e sua libido chegasse ao fim, e se o ego mesmo tivesse novamente sua libido à sua disposição. A tarefa terapêutica consiste, pois, em liberar a libido de suas ligações atuais, subtraídas ao ego, e em torná-la novamente utilizável para o ego. Onde então se situa a libido do neurótico? É fácil encontrá-la: está ligada aos sintomas, o que a ela proporciona a única satisfação substitutiva possível, na época. Portanto, devemos nos tornar senhores dos sintomas e solucioná-los — o que é exatamente a mesma coisa que o paciente exige de nós. A fim de solucionar os sintomas, devemos remontar às suas origens, devemos reconstituir o conflito do qual eles surgiram e, com o auxílio das forças motrizes que, no passado, não estavam à disposição do paciente, devemos conduzir o conflito rumo a um resultado diferente.”

Porque é importante, muitas vezes, falar de trechos longos dos escritos freudianos? Primeiro porque é como pinçar um fragmento revelador, segundo para adentrar nas entrelinhas do dito, mas não escrito. É pretensioso afirmar que uma análise “nunca” termina. E o “nunca” aqui fala de um não tempo. Se pensarmos no imenso arquivo que é o inconsciente, cheio de lembranças proibidas, cheias de culpas, remorsos, dores, amores e ódios, de repressões; é como um quebra-cabeça, que aparentemente não se encaixa. Mas, uma análise mais profunda, vai ligando os “fios”, as “peças”, e vai-se verificando, pelos conteúdos que vão surgindo à consciência, que tudo está conectado, e possui um sentido, único e particular, que diz respeito ao percurso do sujeito e a sua essência. Colocar luz nessa “caverna” escura e obscura é elucidar, “amarrar” os pontos, é dar um sentido as conexões de energias, pelos seus significantes. É separar o joio do trigo. É fazer florescer o trigo e eliminar o joio. Por isso a questão da transferência é importante, porque estão implicados analista e analisando. São dois inconscientes que se interconectam. Mas supõe-se que o analista deve, minimamente, ter o controle da transferência, para não invalidar o processo analítico. É preciso um saber de lugar e direção. As terapias de sugestão devem ser vistas com reservas, porque interfere no livre arbítrio do outro. E é claro que o sujeito, se possível, não se implicaria nem com seu livre arbítrio, para não responsabilizar-se para consigo próprio e suas escolhas. Na análise, a transferência não é mantida intocada, pois há que, os sujeitos se implicarem, para que ao “final” do tratamento, esteja resolvida, e a cura seja efetiva, pelo término dos conflitos, sofrimentos internos e seus sintomas. Como viver o presente, pensar o futuro, sem conhecer e curar o passado?
Referência
FREUD, S. - CONFERÊNCIA XXVIII - TERAPIA ANALÍTICA - Obras Completas de Psicanálise - volume XVI. Rio de Janeiro, Imago-1996. 

19 de junho de 2017

Vida e Morte é um ciclo - Freud e Empédocles de Acragas

  
"Afinal de contas, presumimos que, no decurso do desenvolvimento do homem de um estado primitivo para um civilizado, sua agressividade experimenta um grau bastante considerável de internalização ou volta para o interior; se assim for, seus conflitos internos certamente seriam o equivalente apropriado para as lutas internas que então cessaram. Estou bem cônscio de que a teoria dualista, segundo a qual um instinto de morte ou de destruição ou agressão reivindica iguais direitos como sócio de Eros, tal como este se manifesta na libido, encontrou pouca simpatia e na realidade não foi aceita, mesmo entre psicanalistas. Isso me deixou ainda mais satisfeito quando, não muito tempo atrás, me deparei com essa teoria de minha autoria nos escritos de um dos maiores pensadores da antiga Grécia. Estou prontíssimo a ceder o prestígio da originalidade em favor de tal confirmação, em especial porque nunca pode ficar certo, em vista da ampla extensão de minhas leituras nos primeiros anos, se aquilo que tomei por uma nova criação não constituía um efeito da criptoamnésia."
"Empédocles de Acragas (Girgenti), nascido por volta de 495 a.c., é uma das maiores e mais notáveis figuras da história da civilização grega. As atividades de sua personalidade multifacetada seguiram as mais variadas direções. Ele foi investigador e pensador, profeta e mágico, político, filantropo e médico com conhecimentos de ciências naturais. Diz-se que libertou a cidade de Selinunte da malária e seus contemporâneos o reverenciavam como a um deus. Sua mente parece ter unido os mais agudos contrastes. Era exato e sóbrio em suas pesquisas físicas e fisiológicas; contudo, não se retraiu ante as obscuridades do misticismo e construiu especulações cósmicas de audácia espantosamente imaginativa. Capelle compara-o ao Dr. Fausto, ‘a quem muitos segredos foram revelados’. Nascido, como foi, numa época em que o reino da ciência ainda não estava dividido em tantas províncias, algumas de suas teorias devem inevitavelmente impressionava coisas pela mistura dos quatros elementos, a terra, o ar, o fogo e a água. Sustentava que toda a natureza era animada, e acreditava na transmigração das almas. Mas também incluiu no corpo teórico do conhecimento ideias modernas, como a evolução gradual das criaturas vivas, a sobrevivência dos mais aptos e o reconhecimento do papel desempenhado pelo acaso  nessa evolução."
"Mas a teoria de Empédocles que merece especialmente nosso interesse é uma que se aproxima tanto da teoria psicanalítica dos instintos, que ficaríamos tentados a sustentar que as duas são idênticas, não fosse pela diferença de a teoria do filósofo grego ser uma fantasia cósmica, ao passo que a nossa se contenta em reivindicar validade biológica. Ao mesmo tempo, o ato de Empédocles atribuir ao universo a mesma natureza animada que aos organismos individuais despoja essa diferença de grande parte de sua importância."
"O filósofo ensinou que dois princípios dirigem os eventos na vida do universo e na vida da mente, e que esses princípios estão perenemente em guerra um com o outro. Chamou-os de amor e discórdia. Desses dois princípios — que ele concebeu como sendo, no fundo, “forças naturais a operar como instintos, e de maneira alguma inteligências com um intuito consciente” —, um deles se esforça por aglomerar as partículas primevas dos quatro elementos numa só unidade, ao passo que o outro, ao contrário, procura desfazer todas essas fusões e separar umas das outras as partículas primevas dos elementos. Empédocles imaginou o processo do universo como uma alternação contínua e incessante de períodos, nos quais uma ou outra das duas forças fundamentais leva a melhor, de maneira que em determinada ocasião o amor e noutra a discórdia realizam completamente seu intuito e dominam o universo, após o que o outro lado, vencido, se afirma e, por sua voz, derrota seu parceiro."
"Os dois princípios fundamentais de Empédocles são, tanto em nome (amor e discórdia) quanto em função, os mesmos que nossos dois instintos primevos, Eros e destrutividade, dos quais o primeiro se esforça por combinar o que existe em unidades cada vez maiores, ao passo que o segundo se esforça por dissolver essas combinações e destruir as estruturas a que elas deram origem. Não ficaremos surpresos, contudo, em descobrir que, em seu ressurgimento após dois milênios e meio, essa teoria se alterou em algumas de suas características. À parte a restrição ao campo biofísico que se nos impõe, não mais temos como substâncias básicas os quatro elementos de Empédocles: o que é vivo foi nitidamente diferenciado do que é inanimado, e não mais pensamos em mistura e separação de partículas de substância, mas na solda e na defusão dos componentes instintuais. (o materialismo) Ademais, fornecemos um certo tipo de fundamento ao princípio de ‘discórdia’, fazendo nosso instinto de destruição remontar ao instinto de morte, ao impulso que tem o que é vivo a retornar a um estado inanimado. Isso não se destina a negar que um instinto análogo já existiu anteriormente, nem, é natural, a asseverar que um instinto desse tipo só passou a existir com o surgimento da vida. E ninguém pode prever sob que disfarce o núcleo de verdade contida na teoria de Empédocles se apresentará à compreensão posterior."

A despeito das incursões materialistas, próprio da época em que escreveu, porque remontou Freud pela gênese da filosofia grega, pela via de Empédocles de Acragas para falar não só da alma, mas o que é surpreendente da sobrevivência desta?

Para Empédocles não existe nascimento e morte. O nascer e o morrer, diz respeito ao misturar-se e dissolver e nesse sentido aos quatro elementos divinos, água, ar, terra e fogo, que ele designava como a raiz de todas as coisas, sendo esses quatro elementos inalteráveis, apesar de ter a capacidade de separar-se. Assim surge o conceito de elementos, que “unindo-se dão origem a geração das coisas e, separando-se, dão origem a sua corrupção” (Reale e Antiseri, p.60), e para ele a causa da união seria o amor e da separação o ódio. “Tais forças, segundo uma alternância, predominam uma sobre a outra e vice-versa por períodos de tempo constantes, fixados pelo destino”...(Reale e Antiseri, p.60). Diz Empédocles: “Mas era igual por toda parte e por tudo infinito, Esfero redondo, que goza de sua envolvente solidão”. Se para Empédocles o universo é uma oscilação das forças de agregação do amor e desagregação do ódio, só haverá equilíbrio na constituição do Esfero. “Das coisas e seus poros, saem eflúvios que atingem os órgãos dos sentidos, de modo que as partes semelhantes dos nossos órgãos reconhecem as artes semelhantes dos eflúvios provenientes das coisas; o fogo conhece o fogo, a água conhece a água  e assim por diante (na percepção visual, porém, o processo é inverso, pois os eflúvios partem dos olhos, entretanto, permanece o princípio de que o semelhante conhece o semelhante)”( Reale e Antiseri, p.61). E assim é citado Empédocles: “Com a terra percebemos a terra, com a água, a água; com o éter, o éter divino; com o fogo, o fogo destruidor; com o amor, o amor; com a Contenda, a contenda dolorosa”. Para Empédocles Deus é o Esfero, e a alma do homem constituída de forças cósmicas. Em função de seus erros, vícios e culpa está na roda das reencarnações até expiar o último centil. Reale cita um de seus poemas:
“Também eu sou um desses,
errante e fugitivo dos deuses,
porque confiei na furiosa Contenda...
Porque um dia fui menino e menina,
arbusto e pássaro e mudo peixe do mar...”

Dessa forma é genial que Freud por outras vias e vielas acessa o “inacessível” para a ciência: a alma e sua imortalidade, como ele mesmo diz, sobre a dificuldade de acreditar não somente na concepção de que o instinto de morte reivindica “iguais direitos como sócio de Eros”, mas sem tocar na questão, principalmente para a psicanálise nascente, é possível supor que ele inconscientemente intuía, que a vida e a morte, não só não existe, mas faz parte de um ciclo de evolução da matéria e da alma, ou da psique, como queiram. Mesmo aquilo que aparentemente se configura como um caos está a serviço de um propósito maior, ou seja, da lei, harmonia e equilíbrio. É energia pura que vibra em diversas frequências. É assim que quando observamos um vulcão com suas labaredas e magmas a correr em direção ao mar, vemos que os quatro elementos divinos misteriosamente fluem unidos, não se combatem, mas cada um contribui com sua essência, para que algo novo surja, na sequencia de um propósito maior, isso com certeza encantou Freud e continua a nos encantar; essa harmonia da natureza, da nossa natureza e do universo.

Referências
FREUD, S. - ANÁLISE TERMINÁVEL E INTERMINÁVEL (1937) Obras Completas de Psicanálise - volume XXIII. Rio de Janeiro, Imago-1996.
Reale, G. e Antiseri, D. – HISTORIA DA FILOSOFIA – Volume I – 2ª Edição – São Paulo, Paulinas, 1990