20 de fevereiro de 2015

A música - Ler e Escrever


“A leitura é uma droga que vicia Todo o texto é uma partitura musical. As palavras são as notas. Se aquele que lê é um artista, se ele domina a técnica, se ele desliza sobre as palavras, se ele está possuído pelo texto – a beleza acontece. E o texto apossa-se do corpo de quem ouve. Mas se aquele que lê não domina a técnica, se luta com as palavras, se não desliza sobre elas – a leitura não produz prazer: queremos logo que ela acabe. Assim, quem ensina a ler, isto é, aquele que lê para que os seus alunos tenham prazer no texto, tem de ser um artista. Só deveria ler aquele que está possuído pelo texto que lê. Por isso eu acho que deveria ser estabelecida nas nossas escolas a prática dos “concertos de leitura“. Se há concertos de música erudita, jazz – por que não concertos de leitura? Ouvindo, os alunos experimentarão o prazer de ler. E acontecerá com a leitura o mesmo que acontece com a música: depois de termos sido tocados pela sua beleza, é impossível esquecer. A leitura é uma droga perigosa: vicia… Se os jovens não gostam de ler, a culpa não é só deles. Foram forçados a aprender tantas coisas sobre os textos – gramática, usos da partícula “se”, dígrafos, encontros consonantais, análise sintáctica – que não houve tempo para serem iniciados na única coisa que importa: a beleza musical do texto literário: foi-lhes ensinada a anatomia morta do texto e não a sua erótica viva. Ler é fazer amor com as palavras. E essa transa literária inicia-se antes que as crianças saibam os nomes das letras. Sem saber ler elas já são sensíveis à sua beleza. E a missão do professor?” Rubem Alves In “O Prazer da Leitura”

Esse texto de Rubem Alves nos remonta não só ao prazer, os significantes e significados da leitura, como o autoconhecimento, o conhecimento do mundo, a busca da própria essência, a viagem num mundo cósmico, que não deixa de ser algo ameaçador ao próprio ego, mas, mais que isso, aos frutos que o caminho do conhecimento conduz: o escrever. Repetindo Rubem Alves, escrever é: uma droga que vicia, pois toda escrita “é uma partitura musical. As palavras são as notas.” Se aquele que escreve “é um artista, se ele domina a técnica, se ele desliza sobre as palavras, se ele está possuído pelo texto – a beleza acontece. E o texto apossa-se do corpo de quem” escreve. Mas se aquele que escreve “não domina a técnica, se luta com as palavras, se não desliza sobre elas – a leitura não produz prazer: queremos logo que ela acabe.”... Só deveria escrever aquele que está possuído pelo texto que escreve. Então “deveria ser estabelecida nas nossas escolas a prática dos” “concertos de escrita.” Escrevendo,  experimentarão o prazer de escrever. “E acontecerá com a” escrita “o mesmo que acontece com a música: depois de termos sido tocados pela sua beleza, é impossível esquecer”. O texto escrito com alma possui sons, musicalidade, em suas letras, palavras, frases e pontuações.

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