16 de outubro de 2016

A Contextura psíquica do ódio - O surgimento do “outro”


A Contextura psíquica do ódio 

“Quando o amor acenar, siga-o ainda que por caminhos ásperos e íngremes. Debulha-o até deixá-lo nu. Transforma-o, livrando-o de sua palha. Tritura-o, até torná-lo branco. Amassa-o, até deixá-lo macio; e, então, submete ao fogo para que se transforme em pão para alimentar o corpo e o coração!” Khalil Gibran

O Caminho é o da Paz... É tempo de amar... Esse é um artigo longo, segmentado em seis capítulos e uma síntese: O surgimento do “outro”, O Ressentimento e Mágoa no ódio, A indiferença como expressão do ódio, Masoquismo e Sadismo, O Sadismo como expressão do ódio, O desejo e o ódio e a “Síntese”. Um tema complexo, que diz respeito a civilização atual de forma contundente. É o inicio de uma reflexão que, por muitos séculos, acompanhará a humanidade. É um artigo que ao falar da arquitetura do ódio, reflete em como exterminá-lo do planeta. Tarefa de muitos séculos de evolução no porvir da humanidade. Como o amor vence e vencerá sempre, é preciso desconstruir esse inimigo humano, essa escravidão, que intoxica milhões de vidas e as destrói. Então haverá um tempo que “o amor esfriará do coração dos homens”. A reflexão sobre um sentimento como o ódio, que sempre esteve na história da humanidade, e é constitutiva de forma primitiva, no sujeito, em sua subjetividade, é complexa e por certo há muito que compreender e estudar. Muitos são os enigmas das provações, pelas quais a existência humana se realiza. Para além das importantes leituras sociais, antropológicas sobre a raça humana, temos que pensar no que há de mais complexo em sua constituição, ou seja, seu psiquismo.

1. O surgimento do “Outro”

Na contextura do ódio está um sujeito e um outro, como objeto, que sofre. E esse outro, é colocado no inverso do objeto de desejo. Então o primeiro passo, é pensar a superação dessa contextura através do sentimento de culpa, pois esse possui um lugar importante nas reelaborações do sujeito, representando não só a consciência de algo contrário à lei, como uma tensão entre o ego e o superego. “O ego reage com sentimentos de ansiedade à percepção de que não esteve à altura das exigências feitas por seu ideal, ou superego”. O ego esse conciliador do id, do superego e do consciente, representa o inconsciente e o consciente. Em uma primeira instancia pode-se falar de um masoquismo inconsciente, mas no sadismo, há sempre um saber intuitivo de que o “outro sofre”, pois essa é a fonte do prazer do sádico; comprazer-se no sofrimento do outro. A relação com o outro é mediada pelo corpo, há um corpo, enquanto materialização do significante, em ação.

A relação com o outro é comandada pelas atitudes, com relação ao que, se é para o outro. “E, como a existência do outro revela-me o ser que sou, sem que eu possa apropriar-me desse ser ou sequer concebê-lo, assim o outro me olha e como tal, detém o segredo de meu ser e sabe o que sou”...(Sartre, p. 452). A atitude em relação ao outro, é a experiência do outro, ao mesmo tempo em que se é, a experiência do outro, o que remete ao “ser presença”, “presença” que pode necessariamente implicar em um corpo. A relação com o outro pressupõe uma dialética, que para consumar na morte do outro, deve sair do masoquismo ao sadismo, que alimenta o ódio.

A relação com o outro não é linear, a diferença está na quantidade, qualidade dos impulsos masoquistas. Cada sujeito “detém o segredo do que se é”. Nessa suposta condição “sabe” porque “tem que fazer-se sofrer”, o que é um mínimo de consciência ontológica, que reivindicará a responsabilidade pelo que se é, e o inerente projeto de recuperação, que diz respeito a liberdade de estar saudável.  Assim a insegurança de se diluir pela existência do outro e o outro diluir-se em sua existência, é uma contingência superável e deve ser um ideal realizável na relação com o outro. “Porque iria eu querer apropriar-me do outro não fosse precisamente na medida que o Outro faz-me ser? Mas isso comporta justamente certo modo de apropriação: é da liberdade do outro enquanto tal que queremos nos apoderar. E não por vontade de poder: o tirano escarnece do amor, contenta-se com o medo. Se busca o amor de seus súditos, é por razões políticas, e, se encontra um meio mais econômico de subjugá-los, adota-o imediatamente. Ao contrário aquele que quer ser amado não deseja a servidão do amado. Não quer converter-se em objeto de uma paixão transbordante e mecânica. Não quer possuir um automatismo, e, se pretendemos humilhá-lo, basta descrever a paixão do amado como sendo o resultado de um determinismo psicológico: o amante sentir-se-á desvalorizado em seu amor e em seu ser” (Sartre, p. 457-458). No amor a liberdade enquanto liberdade é deixar-se ser. O amante não deve exigir ser a causa, mas sim como diz Sartre “a ocasião única e privilegiada”. Então se não há uma relação senhor x escravo, próprio da neurose obsessiva em suas diversas variantes, há uma subjetividade, uma “escolha absoluta”, própria de almas similares. O sujeito é linguagem, enquanto pensamento, fala e representações, e essas sempre escaparão. Assim é difícil saber se o que se deseja significar é aquilo que supõe revelar como significante, o que só seria possível pela telepatia.

O masoquismo, esse sofrimento “auto-imposto”, é colocar-se frente a um abismo, pois a subjetividade do outro é um enigma. “O masoquismo, tal como o sadismo, é a assunção de culpabilidade. Sou culpado, com efeito, pelo simples fato de que sou objeto. Culpado frente a mim mesmo, posto que consinto em minha alienação absoluta; culpado frente ao outro, pois dou-lhe a ocasião de ser culpado, ou seja, de abortar radicalmente minha liberdade enquanto tal” (Sartre, 471). Assim o fracasso lhe é inerente, pois o submeter-se ao próprio sofrimento como princípio de prazer, é um “vício” e o vício é um fracasso, ou seja, os recursos psíquicos saudáveis fracassaram. Mas buscar o próprio fracasso faz parte do masoquismo. Continua em: https://caminhosdapsiq.blogspot.com.br/2016/10/a-contextura-psiquica-do-odio_21.html
(Referências na Síntese do artigo, quando for publicado)

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