7 de agosto de 2013

Ciência, História e Subjetividade

O livro de Jaime Pinsky em "Porque Gostamos de História", traz a reflexão acerca da paixão de escrever, porque escrever é contar história em suas diversas formas, metodologias, intenções, desejos. É uma relação especular com o ego e com o outro. Escreve-se para si e para o outro.
A História não é como a estatística que, devidamente manipulada, diz o que queremos. Mesmo assim há quem insista em torturá-la, exigindo que ela confesse crimes que não cometeu”.
“Por que gostamos de História?”
“Para um historiador é sempre agradável constatar a simpatia com que as pessoas comentam sua atividade: "Puxa, se eu não fizesse Medicina, faria História", ou "adoro livros de História", ou "eu adorava as aulas de História no colégio", e ainda "deve ser gostoso fazer pesquisa histórica". Claro, pode ser que as gentes estejam apenas querendo agradar ao exercerem a proverbial cordialidade brasileira. Contudo, convenhamos, fica difícil imaginar as frases equivalentes dirigidas a profissionais como, por exemplo, economistas, advogados ou dentistas. De modo que tendo a acreditar na sinceridade dos brasileiros nesse particular, mesmo porque a declaração de amor à História vem respaldada por números muito expressivos de venda de livros da área, escritos ou não por historiadores de ofício. Se acrescentarmos às obras especificamente históricas os romances históricos, as biografias e, ainda, a "militária" (livros sobre estratégias, guerras e guerreiros), veremos que o setor é muito querido e repete por aqui o sucesso que tem conquistado em muitos outros países”.
“Dois motivos parecem explicar a popularidade dos livros de História. O primeiro é que temos enorme curiosidade em saber de onde viemos, onde estão nossas raízes familiares, étnicas, nacionais, culturais. Visitar e compreender o passado é uma tentativa de nos entendermos melhor, de buscar - nem sempre com sucesso - explicações sobre o aqui e agora. "Sou assim porque tenho sangue espanhol", ou "é tradição entre os mediterrâneos valorizar mais o filho homem", ou ainda "somos os herdeiros do povo do livro" são constatações de caráter supostamente histórico que teriam por função nos situar como agentes históricos. O mundo ocidental tem, no mínimo, sérias dúvidas sobre uma suposta vida depois da morte, desistiu de responder a uma das inquietações vitais do ser humano: "para onde vou?" Resta-lhe o consolo de, pelo menos, tentar explicar de onde vem”...
“O outro motivo é explicado, ou melhor, foi explicado pelo dramaturgo grego Sófocles, há 25 séculos. Ele dizia que, de todas as maravilhas do mundo, o homem é a mais interessante para os próprios seres humanos. De fato, nós nos percebemos espelhando-nos nos outros: ao utilizar o próximo como referência é que podemos medir nossa inteligência ou estultice, nossa beleza ou falta de graça, nossa habilidade ou falta de jeito. Olhar e ver outros seres humanos, verificar como estão vivendo, como se organizam socialmente, quais os tabus que respeitam, qual o papel que desempenham os velhos, as crianças, as mulheres em diferentes sociedades, tudo isso nos fascina. Será que aquele povo encontrou uma forma política mais eficiente que a nossa? Quem sabe aquele outro achou deuses mais benevolentes e eficazes que os nossos? Adoramos civilizações antigas, devoramos livros sobre egípcios (de então, não de agora), gregos (idem), hebreus, romanos (idem, idem). Por vezes, até o leitor se atrapalha e confunde povos que de fato existiram e sobre os quais temos provas documentais com outros que se originam da imaginação de espertalhões”.
“Além de tudo, os bons livros de História têm uma... história. As narrativas, os processos, estabelecem conexão entre os episódios. Desde a infância, gostamos de boas histórias; por que não gostar daquelas, por assim dizer, verdadeiras?”
“Claro que o mundo está cheio de falsos historiadores (dentro e fora da universidade), aqueles que partem de uma tese pronta e vão buscar apenas os argumentos que a comprovam, rejeitando, no processo investigativo, todos os documentos que poderiam contradizer seu ponto de partida. É aquela história de "se os fatos negarem minha teoria, pior para os fatos". Por meio de manipulação do acontecido pode-se provar qualquer coisa e até o contrário dessa coisa. Esse método tem sido muito usado para se "provar" superioridade nacional, racial e de gênero. Tem sido usado para se "provar" direitos territoriais. Tem sido usado para desqualificar e mesmo ridicularizar heróis, desde que não sejam os "nossos". Daí a necessidade de os leitores, amantes da História, tomarem certas precauções com relação à origem das "verdades" que encontram e reproduzem. A internet, assim, genérica, não é fonte. Mesmo quando os textos são apresentados com assinaturas que parecem confiáveis. Não apenas nossos textos são apropriados indevidamente na web, como as pessoas nos atribuem afirmações que nunca fizemos. Operar uma crítica de fontes é, pois, fundamental”.
“De resto, nada como se assegurar da formação do suposto historiador. Não, não é preciso fazer curso de História para publicar livros, mas é preciso ser rigoroso no que se pesquisa e responsável no que se escreve para ser confiável. Do contrário, serão apenas histórias da carochinha”.

O livro reflete a realidade de como se lida com os fatos. Em tudo que escrevemos, seja a que área pertence o saber profissional ou pesquisa há que contextualizarmos o momento cultural, social, político, econômico e principalmente a subjetividade do autor. Não é possível escrever sem se implicar, não existe a ciência neutra, imparcial. A história do processo “civilizatório” deu-se em grande medida sob o imperialismo da dominação cultural, onde o mundo chamado civilizado coopta a essência de outra cultura. Foi assim a relação entre os civilizados e os chamados povos bárbaros. É assim a relação entre ocidente e oriente, em que dessacraliza as culturas orientais para tornar seus arcabouços filosóficos, “científicos” nos moldes ocidentais, ou fazer uma leitura da filosofia oriental, retirando sua essência, transformando-a em um objeto de consumo. As construções cientificas estão sempre articuladas, politicamente, seja de que forma for. Podemos lembrar também, as questões em torno do DSM V e do uso da Ritalina em crianças e adolescentes. A questão é a quais interesses correspondem. No que diz respeito à subjetividade, há que lembrarmos para além do politicamente articulado, os aspectos da subjetividade em questão: a estrutura de defesa do pesquisador, seu funcionamento, seu narcisismo, sua relação com o prazer, sua lei interna, e tudo que o compõe. Assim não há verdades absolutas, imparciais, e os “imperativos categóricos” estão submetidos às circunstancias históricas que os determinam, ou seja, no processo de evolução da humanidade e humanidade aqui, no sentido de um Ser Humano, mais humano, mais ético e menos materialista e com maior capacidade de sublimação de seus instintos primários.

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