1 de agosto de 2013

Winnicott e a análise de criança

“A criança joga (brinca), para expressar agressão, adquirir experiência, controlar ansiedades, estabelecer contatos sociais como integração da personalidade e por prazer”.

No trabalho de Winnicott possui relevância a teoria do “amadurecimento pessoal” e o uso dos fenômenos de regressão à dependência, na interação paciente/analista, que fornece o holding necessário e deve decidir quando falar e quando silenciar, particularmente nas situações de “descongelamento” do trauma, sobretudo em casos de pacientes graves. O respeito à individualidade e singularidade da criança em desenvolvimento, os ritmos e as peculiaridades de cada uma devem ser sagradamente respeitados. Embora seja uma teoria aplicável às crianças em geral, será na prática clínica a realização de seus conceitos.


Esses momentos de “descongelamentos” o analista não deve se justificar nem interpretar  devendo aguardar o momento oportuno para comentar o assunto. As situações traumatizantes estão aquém das recordações e verbalizações, só podendo ser resgatadas através da exteriorização do paciente, com os consequentes turbilhões emocionais na relação analítica, com a imprescindível continência do analista. Dessa forma, a técnica clássica de recordação e explicação foi cedendo lugar ao vivenciar e compartilhar com o analista.


O núcleo do desenvolvimento psíquico só poderá ser retomado na interação paciente-analista em nova versão da relação mãe-bebê. Diferentemente da posição neutra e “espelhadora” da análise clássica, a interação, que assume conscientemente o impacto sobre o paciente e a responsabilidade do analista, são fatores de êxito do trabalho psicanalítico. O modo pré-verbal de comunicar do paciente é a maneira de a criança “falar” com sua mãe. Dentro da concepção winnicottiana, a regressão deixa de ser um mecanismo de defesa a ser evitado a todo custo, por provocar acting-out, para se tornar indispensável, pois provê a oportunidade de experimentar, na relação analítica, as falhas ambientais e de vivenciar partes dissociadas na relação primitiva mãe-bebê.


Cabe ao analista, após a tormenta emocional, encontrar as palavras para a realidade do sofrimento do paciente. A regressão ocorre por se reconhecer a experiência intrusiva ou de privação e pela capacidade do analista de conter a raiva, a dor e o temor sem ser destruído, sem interromper a análise. Sempre haverá objetos subjetivos e objetivos e o incessante caminhar para a realidade e o uso de objetos, sempre persistirá uma comunicação silenciosa com o objeto subjetivo, como um refúgio e uma forma preventiva de não se ligar tão facilmente com algum grau de relações objetais falsas ou submissas; a comunicação silenciosa e secreta com objetos subjetivos restaura o senso de real para o si-mesmo. Todos esses elementos fazem parte do que ele denominou de “manejo do setting. A experiência analítica é um processo muito maior do que um conjunto de interpretações. O silêncio do analista faz parte do manejo técnico do setting, juntamente com outros elementos, como prolongar a duração da sessões, permitir que o paciente ande pela sala, que se sente ou fique de pé etc. O analista suprirá a necessidade do jogo ilusório materno privilegiando a criatividade em todos os níveis, cuidando para que o “fazer analítico” não paralise o processo criativo. A técnica winnicottiana, assim, recoloca o problema do “lugar do analista” juntamente com a constituição do sujeito psíquico e sua relação com o ambiente facilitador, sendo essa interação o elemento estruturante por excelência, não se podendo aceitar a vida psíquica como subproduto da organização libidinal.


O importante é que a criança sinta-se à vontade, desarmada, confiante de que possa se expressar e de que suas questões serão acolhidas. O desenho ou qualquer outro recurso é apenas um instrumento para que o diálogo se estabeleça de forma natural e o terapeuta possa quando for possível inserir elementos, possibilidades alternativas de ser e fazer.


Referências

Winnicott, D. W. (1978). Aspectos clínicos metapsicológicos da regressão dentro do setting psicanalítico. In Da pediatria à psicanálise. Rio de Janeiro: Francisco Alves. (Trabalho original publicado em 1954.)

Nenhum comentário: