30 de outubro de 2015

Lições de Psicanálise II

"Também a psicologia é uma ciência natural. O que mais pode ser? Mas seu caso é diferente. Nem todos são bastante audazes para emitir julgamento sobre assuntos físicos, mas todos — tanto o filósofo quanto o homem da rua — têm sua opinião sobre questões psicológicas e se comportam como se fossem, pelo menos, psicólogos amateurs. E agora vem a coisa notável. Todos — ou quase todos — concordaram que o que é psíquico tem realmente uma qualidade comum na qual sua essência se expressa, a saber, a qualidade de ser consciente — única, indescritível, mas sem necessitar de descrição. Tudo o que é consciente, dizem eles, é psíquico, e, inversamente, tudo o que é psíquico é consciente; isso é autoevidente e contradizê-lo é absurdo. Não se pode dizer que essa decisão lance muita luz sobre a natureza do psíquico, pois a consciência é um dos fatos fundamentais de nossa vida e nossas pesquisas dão contra ele como contra uma parede lisa, e não podem encontrar qualquer caminho além. Ademais, a igualação do que é mental ao que é consciente tem o resultado incômodo de divorciar os processos psíquicos do contexto geral dos acontecimentos no universo e de colocá-los em completo contraste com todos os outros. Mas isso não serviria, uma vez que não se pode desprezar por muito tempo o fato de que os fenômenos psíquicos são em alto grau dependentes das influências somáticas e o de que, por seu lado, possuem os mais poderosos efeitos sobre os processos somáticos. Se alguma vez o pensamento humano se encontrou num impasse, foi aqui. Para descobrir uma saída, os filósofos, pelo menos, foram obrigados a presumir que havia processos orgânicos paralelos aos processos psíquicos conscientes, a eles relacionados de uma maneira difícil de explicar, que atuavam como intermediários nas relações recíprocas entre ‘corpo e mente’, e que serviam para reinserir o psíquico na contextura da vida”.
Referência
FREUD, S. ALGUMAS LIÇÕES ELEMENTARES DE PSICANÁLISE (1940 [1938]). Obras Completas de Psicanálise - volume XXIII. Rio de Janeiro, Imago-1996. 

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