Há que se pensar a questão de Direitos Humanos e Saúde
Mental nas categorias do outro dialético, constituído de responsabilidade e
liberdade, que é a condição da razão. Se há prejuízo em sua capacidade de
julgamento e contato com o real, há liberdade e responsabilidade. O sujeito não
está destituído de sua subjetividade e seus afetos. O problema ético é de
direção clínica. A crise e seus sintomas sejam eles delírios, manias,
depressão, alucinação, processos obsessivos compulsivos, uso de substancias
psicoativas, ansiedade, angústia, sadismo, masoquismo, etc. Que em muitos
sujeitos podem estar “colados” ao ego como parte integrante deste, não pode
prescindir da alteridade do sujeito, sua autonomia e respeito. Se os sintomas
de defesa são incapacitantes para o trabalho ou para a autonomia, há que
resgatá-los para facilitar o processo transferencial necessário às associações
inconscientes em um tratamento humanizado, de acolhimento, escuta “fina”,
resgate da história do sujeito para que seja possível a simbolização de seu
mundo interno e ele não seja morto simbolicamente. Só assim é possível
contrapor a estigmatização, (que abrange negros, mulheres, crianças,
desempregados, pobres, pessoas com dificuldades, idosos, "doentes
mentais") que se apoia em uma “condição original” e anula a condição
humana. O direito ao atendimento médico-psicológico em liberdade, a falar em
vez de calar com o medicamento (a medicação é necessária em alguns casos, mas
não como clínica), pois como clínica aliena o sujeito a si próprio, ao trabalho
e moradia, ao acompanhamento das famílias, para que sejam preparadas a
cuidar de quem precisa de cuidados específicos. As situações mais graves
dizem respeito às crianças e adolescentes que são colocadas em instituições
para medicalização.
A lei de internamento compulsório, ou seja, de um
internamento judicial ou um sistema que se estabelece de controle judicial de
internamento e assim de limpeza higiênica histórica da sociedade? Lembremo-nos
dos leprosos dos tempos remotos e as leis que os segregavam. Esta tem sido a
história da humanidade. Se a família não consegue lidar com os sintomas de seus
membros cabe essa transferência no sentido psicanalítico ao Estado de Direito?
Como é possível construir uma “clínica da cura” com segregação? Seja no sentido
do preconceito, da higienização ou do “status” do “lugar de poder” em que o
profissional se coloca? Afinal “há um outro”, doente, no sentido a que Lacan se
refere, onde não há implicação dos profissionais e do próprio Estado. No mundo
em que vivemos precisamos como os Médicos Sem Fronteiras de Psicólogos Sem
Fronteiras.
Dessa forma o que vemos nas categorias abordadas acima é a
morte civil do sujeito, a loucura “fabricada”, produzida. Há que se interrogar:
se as circunstancias e vicissitudes fossem outras mesmo a despeito da
filogenética, quais seriam os destinos desses sujeitos? Os medicamentos? Os erros
de diagnóstico? Existe diagnóstico diferencial ou a grande maioria são
enquadrados em uma sigla? no
Iêmen, imigrantes são libertados de
contrabandistas: "A maioria dos imigrantes referidos para o hospital de
Al-Mazraq foram vítimas de tráfico de pessoas e submetidos a trabalho análogo à
escravidão. Eles apresentavam sintomas de tortura e abusos verbal, físico e
sexual. Alguns deles tiveram suas unhas arrancadas ou suas línguas parcialmente
cortadas; outros levaram surras. A equipe de MSF também tratou pessoas com
doenças graves que podem ameaçar suas vidas, como pneumonia, malária grave ou
dengue". http://www.msf.org.br/noticias/1649/no-iemen-imigrantes-sao-libertados-de-contrabandistas
Da dicotomia loucura-razão é possível interditar-se um sujeito, com abordagens “técnicas”, subjetivas, "jurídicas". É muito comum ouvir dos pacientes internados em instituições psiquiátricas: “se quiser sair daqui tem que se comportar como eles querem”. Assim muitas têm sido as Declarações de Direitos Humanos e Saúde Mental, citamos aqui alguns trechos nos endereços abaixo:
O direito
ao consentimento informado completo
Divulgação
completa de todos os riscos documentados de qualquer droga ou “tratamento”
proposto.
O direito
de ser informado de todos os tratamentos médicos disponíveis, que não incluem a
administração de um medicamento ou tratamento psiquiátrico.
O direito
de recusar qualquer tratamento que o paciente considere prejudicial.
Não pode
ser administrada a nenhuma pessoa tratamento psiquiátrico ou psicológico contra
a sua vontade.
A nenhuma
pessoa, homem, mulher ou criança, pode ser negada a sua liberdade pessoal
devido a suposta doença, mental sem um julgamento justo pela justiça e com
representação legal apropriada.
O paciente
tem:
O direito
a ser tratado com dignidade como ser humano.
O direito
a ter um exame físico e clínico completo por um médico de medicina geral registrado
e competente de escolha pessoal, para assegurar que a condição mental de uma
pessoa não é causada por qualquer doença física, ferimento ou defeito, não
detectada e sem tratar e o direito a procurar uma segunda opinião médica da sua
escolha.
O direito
a instalações médicas totalmente equipadas e pessoal médico treinado de forma
apropriada nos hospitais, para que possam ser executados exames clínicos e físicos
competentes.
O direito
a escolher o gênero ou tipo de terapia a ser utilizado e o direito a discutir
isto com um médico de medicina geral, ou de escolha pessoal.
O direito
a que todos os efeitos secundários de qualquer tratamento oferecido sejam
tornados conhecidos e compreensíveis para o paciente, por escrito e na língua
materna do paciente.
O direito
de aceitar ou recusar tratamento, mas em particular, o direito de recusar a
esterilização, tratamento de eletrochoque, choque de insulina, a lobotomia (ou
qualquer outra operação cerebral psicocirúrgica), terapia de aversão,
narcoterapia, terapia de sono profundo e quaisquer drogas que produzem efeitos
secundários indesejados.
O direito
a fazer queixas oficiais, sem represálias, a um quadro independente, que é
composto por pessoal não psiquiátrico, advogados e leigos. As queixas podem
abranger quaisquer tratamentos ou punições tortuosos, cruéis, desumanos ou
degradantes recebidos enquanto sob cuidado psiquiátrico.
O
direito a ter aconselhamento privado e individual.
O direito
a se libertar de uma instalação psiquiátrica em qualquer altura e a estar livre
sem confinamentos.
O direito
a gerir a sua própria propriedade e assuntos com um conselheiro legal, se
necessário, ou se considerado incompetente por um tribunal, a ter um advogado
executor nomeado pelo Estado para gerir tais propriedades até ser considerado
competente. Tal executor é responsável perante a família próxima do paciente,
ou conselheiro legal ou tutor.
O direito
a ver e a possuir os registros hospitalares pessoais e a agir legalmente de
acordo a qualquer informação falsa aí contida que possa ser prejudicial para a
reputação pessoal.
O direito
a procurar ação criminal, com a ajuda plena de agentes da autoridade, contra
qualquer psiquiatra, psicólogo ou pessoal hospitalar no caso de qualquer abuso,
falsa detenção, agressão como resultado do tratamento, abuso ou violação
sexual, ou qualquer violação da saúde mental ou de outra lei. E o direito a uma
lei de saúde mental que não indeniza ou modifica as penas para o tratamento
criminoso, abusivo ou negligente de pacientes, cometido por qualquer
psiquiatra, psicólogo ou pessoal hospitalar.
O direito
a processar os psiquiatras, as suas associações e faculdades, a instituição, ou
o pessoal por detenção ilegal, relatórios falsos ou tratamento prejudicial.
O direito
à educação ou treino para capacitar uma pessoa a ganhar o seu sustento quando recebe
alta e o direito de escolha quanto ao tipo de educação ou treino que é
recebido.
O direito
a receber visitas e um ministro da sua fé.
O direito
de fazer e receber telefonemas e o direito à privacidade respeitante a toda a
correspondência de e para qualquer pessoa.
O direito
a associar–se livremente ou não com qualquer grupo ou pessoa numa instituição,
hospital ou instalação psiquiátrica.
O direito
a um ambiente seguro sem ter nesse ambiente pessoas quer foram colocadas aí por
razões de crime.
O direito
a estar com outras pessoas do seu grupo etário.
O direito
a usar roupas pessoais, a ter pertences pessoais e a ter um lugar seguro onde
os colocar.
O direito
a uma dieta e nutrição apropriada e a três refeições diárias.
O direito
a instalações higiênicas e não superlotadas, e a tempo de lazer e descanso
suficiente e imperturbável.
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