“A
psicanálise, devo lembrar a título de preâmbulo, é uma disciplina que no
conjunto das ciências se apresenta a nós com uma posição realmente particular.
Costumam dizer que ela não é uma ciência propriamente dita, o que parece
implicar por contraste que ela é simplesmente uma arte. É um erro, se por isso
entendermos que ela é tão semente uma técnica, um método operacional, um
conjunto de receitas”.
“Mas não é
um erro se empregarmos essa palavra “arte”, no sentido em que era empregada na
Idade Média, quando se falava das artes liberais – vocês conhecem a série que
vai da astronomia à dialética, passando pela aritmética, a geometria, a música
e a gramática”.
“É nos
certamente difícil apreender hoje, dessas artes ditas liberais, a função e
alcance na vida e no pensamento dos mestre medievais. No entanto, é certo que o
que as caracteriza e as distingue das ciências que delas teriam se originado é
que conservam em primeiro plano o que se pode chamar uma relação fundamental
com a medida do homem”.
“Pois bem,
a psicanálise talvez seja atualmente a única disciplina comparável a essas
artes liberais, pelo que preserva dessa relação de medida do homem consigo
mesmo – relação interna, fechada sobre si mesma, inesgotável, cíclica, que o
uso da fala comporta por excelência. É justamente por isso que a experiência
analítica não é objetivável. Comporta sempre no seio de si mesma a emergência
de uma verdade que não pode ser dita, porque o que a constitui é a fala e seria
preciso, de certo modo, dizer a própria fala, o que é, propriamente falando, o
que não pode ser dito enquanto fala”.
O Mito
Individual do Neurótico – Jacques Lacan
Na série Paradoxos de Lacan acompanhamos suas
falas, naquilo que muitas vezes parecem estar na contramão, mas é apenas uma
forma de recolocar os profundos dilemas da existência humana. Em O Mito
Individual do Neurótico vemos a fala sobre a psicanálise de forma particular,
articulando-a como uma arte, como na Idade Média colocava-se a
astronomia, a dialética, aritmética, a geometria, a música e a gramática e que
conservam uma relação fundamental com o humano. A psicanálise conserva essa
relação com o humano de forma única, pois o acesso ao profundo, pela fala
permite o acesso ao que não pode ser dito pela fala. E a psicanálise é uma técnica científica e também uma arte, na medida em que permite ao sujeito, a livre expressão de seu inconsciente, seja através da literatura, do teatro, do cinema, da música da imagem fotográfica e da fala, que resinifica a história do sujeito.
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