1 de maio de 2013

Ética - Judiciário e Legalidade

JUDICIÁRIO - Legalidade, Finalidade e Bem Comum

Muitos têm sido os escritos sobre estatutos, códigos, leis que versam sobre o Estado de Direito e Legalidade. Mas quando vemos o judiciário que deve ser uma instituição de aplicação da justiça humana, tornar-se motivo de investigação por “aplicação” de injustiças, ou seja, podemos afirmar que temos uma instituição legal para execução das injustiças? Por certo que não, mas é possível interrogar, pois na inquisição também tínhamos uma instituição que se autodenominava com o direito de aplicar a justiça Divina. Há que se pensar que ao examinar as práticas que possuem por base a legalidade, e os códigos de ética refletir sobre a “finalidade” da retidão moral, do agir “por dever”, da “boa intenção”,  que para Kant é o “estado” transcendental para onde caminha o “espírito” humano. É necessário pontuar as reflexões sobre o que é possível conhecer e fazer que esteja no plano da razão pura ou prática: “O nosso conhecimento representa o produto da elaboração de uma série harmônica de sensações com as ajudas necessárias da inteligência”... “Só enquanto podemos experimentar as impressões que nos facultam; encontram aplicação os princípios fundamentais da razão”... “Tendo como realista a orientação que parte das coisas e por idealista a que assenta nas ideias”... “A vontade moral quando não colide com qualquer fim secundário diante de si mesma; é aquela que pratica o bem pelo prazer de praticá-lo. Nem no universo nem fora dele, poderemos imaginar o que possa considerar-se, sem qualquer limitação, como bom; mas é possível a algo impor-se como uma boa intenção. Cumpramos o dever pelo próprio dever”... “A reta intenção o que de mais elevado existe no universo, todos os seres humanos devem ser tratados com respeito”... (Crp. – p.10, 11,12). Que alguns “juristas” possam ter “esquecido” o que “aprenderam” na academia ou nos estudos para os concursos públicos é da ordem da memória ou da estrutura psíquica e de caráter do sujeito que exerce o jurídico? É uma passagem ao ato no campo do perverso na medida em que se “burla” a lei? Se a lei é um imperativo, os homens de “razão incorruptível” irão agir de acordo com a lei. E esta razão para ser incorruptível  correlaciona os princípios da vontade em uma ação consigo mesma, ou seja, a priori, assim os motivos determinantes da vontade, possibilitam a construção de uma lei para todos os seres racionais. É possível interrogar aqui que juízos os homens articulam sobre a correlação de suas ações à lei? Como no homem a lei é um imperativo, a razão incorruptível é por si mesma um imperativo, e considerada como prática a priori. Mas nessa vontade há interferência de causas sensíveis, portanto como diz Kant “não pode supor nela uma vontade santa”. Só a vontade santa transforma a lei moral, num imperativo. Assim quando a relação da vontade com a lei é de dependência, é denominado dever. Quando não há correspondência da vontade com a lei o arbítrio é “patologicamente afetado” o que são os casos dos noticiários sobre corrupção no judiciário, em função das causas subjetivas. Necessita-se então de uma coação interna, estabelecida pela lei, que se efetiva no sujeito, cujas representações são objetos da razão.

Essa distância entre, a aplicação da lei e a finalidade diz respeito aos deveres do direito. E esse direito objetiva prevenir todo tipo de maldade entre os homens, mas não impede que elas sejam realizadas. Ele existe para o erro, porque se este não existisse, enquanto inclinação, não seria necessário a lei, o direito; e estar-se-ia diante de uma “inteligência bastante a si mesma”, ou seja do “conceito de santidade acima de todas as leis práticas”. Como a santidade da vontade que conduz ao bem comum é algo de mais elevado que a razão pura prática acima das leis práticas, a legalidade é a representação de um caminho que deve ser percorrido no caminho para autonomia do livre-arbítrio. Pode-se supor que em várias circunstâncias a vocação do Estado é conflitiva com a vocação do sujeito (com o livre arbítrio), estado em que a finalidade não se configura em “imperativo categórico” no plano do sujeito. Para o “servidor público” o espectro deve ser o cumprimento do dever, enquanto lei moral, pois esta exprime a liberdade e a autonomia da razão, estando contidas todas as máximas. Se não o for este sujeito não impõe o objeto de desejo, à vontade, à lei o que seria o livre-arbítrio, e segue impulsos e inclinações peregrinando por máximas, suposições do senso comum, leis patológicas, que jamais serão legislação universal ou terá legalidade. Kant na Paz Perpétua, fala da complexidade dessa questão: “Mais incerto ainda é um direito das gentes, supostamente estabelecido sobre estatutos redigidos segundo planos ministeriais, que na verdade é apenas uma palavra sem conteúdo e repousa sobre contratos que no próprio ato de sua conclusão contém igualmente a cláusula secreta de sua transgressão”(TS –p.146). Assim o dever nas leis é possibilitar o próprio bem-estar (amor-próprio, que pressupõe a preservação da vida) e o bem-estar dos outros. Essa lei não é um objeto do livre arbítrio, mas indica a forma de universalidade necessária  pela razão como condição de valor da própria lei, objetiva à máxima do amor próprio e chega a ser o fundamento determinante da vontade. Se há o desejo a finalidade do bem comum, há que se pensar no dever descrito por Kant: “O que se deva fazer, segundo o princípio da autonomia do livre arbítrio, é facílimo de intuir sem qualquer vacilação, até para a mais vulgar das inteligências; mas o que se deva fazer debaixo da suposição da heteronomia do mesmo é difícil, exigindo conhecimento do mundo, ou seja, o que é dever se apresenta por si mesmo a cada um... A lei moral, porém ordena a cada um o mais pontual dos cumprimentos... Satisfazer o mandato categórico da moralidade está, a qualquer tempo, na faculdade de cada um; satisfazer, porém, o preceito empírico da felicidade condicionada não é dado a cada um, sendo possível apenas raras vezes, ainda quando em relação a uma única intenção. No primeiro só se trata da máxima que deve ser verdadeira e pura; no segundo, todavia, tratamos também das forças e da potencialidade física de produzir realmente um objeto desejado. Seria insensatez um mandato segundo o qual cada um deve tratar de tornar-se feliz, porque nunca se ordena que alguém faça o que por si mesmo indefectivelmente deseje” (Crp. – p.66 – 67). Ordenar, a moralidade sob o nome de dever é razoável, pois onde os sujeitos em seus preceitos não desejam a vivência da lei, vendo na mesma um contraste às suas inclinações. Dever-se-ia ordenar-lhe, ou antes, facultar-lhe, as medidas que tem de tomar, porque o sujeito não pode tudo o que quer. Mas qual a finalidade da lei? Falar de finalidade é falar de “perpetuidade obrigatória do esforço moral”, da vontade inteiramente boa independente de todas as influências das contingências que a experiência possibilita. E o percurso da perpetuidade obrigatória é o dever, a legalidade, o “imperativo categórico”. Estar-se-á diante da constante luta entre a pureza das intenções e as inclinações humanas. E neste trânsito entre a pureza das intenções e as inclinações humanas encontram-se a legalidade e o direito, pois para todo dever há um direito. Então a máxima da prudência aconselha que a lei da moralidade seja determinante. 

Referência
KANT, Immanuel. Crítica da Razão Prática – 1788. Tradução de Bertagnoli, Afonso. 3ª edição. Edições e Publicações Brasil Editora S.A – São Paulo 1959. 

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