Muitos foram os conceitos apreendidos por Lacan na obra de
Hegel, principalmente na Fenomenologia do espírito. Faremos aqui algumas
anotações, no que diz respeito à relação sujeito-objeto, do que muito se ocupou
Lacan. Como Hegel é contemporâneo de Kant e em certo sentido há que passar pela
Crítica da Razão Pura, há que afirmar que a razão ocupa de si e dos objetos.
Isso não há dúvida, tão pouco sua dialética. Sua dialética é o movimento que
inspira o caminho da razão pela apropriação de um saber sobre si que desvela
não só a si, mas o próprio caminho. Os contrários que compõe o movimento
depara-se todo o tempo com inúmeras vicissitudes entre as certezas do sujeito e
a verdade do objeto, que pertencem à história deste. No sentido de causalidade
o sujeito é um fenômeno para si próprio ao tempo em que busca um saber sobre si
e sobre os objetos ao longo de suas experiências. Se a vida é revelada enquanto
verdade pela natureza, o destino do homem é decifrar seu próprio enigma no
bioma que é ele. Escutando a natureza ele encontra pela razão significados para
a aparência da sem-razão dos conflitos de sua existência. Só então surge a
certeza da consciência-de-si.
Mas não é possível a consciência-de-si sem a “consciência do outro”, que é “consciência-de-si, ser-refletido em si, consciência
de si mesmo no seu ser outro”.
Se a vida é um constante fluir, aonde as diferenças vão se
extinguindo, a consciência-de-si um “retorno a partir do ser-outro”. Movimento
esse que pertence ao mundo sensível da percepção, que encontra eco na essência
do ser, que é o inconsciente. E para o inconsciente o que vale é o desejo.
Assim se a verdade do objeto é a verdade do ser é por que o imperativo que
irrompeu é o desejo. Então a consciência-de-si ao satisfazer-se, revela o
desejo e a dependência do objeto para sua satisfação. Como há algo de egoísta
no desejo e o objeto não exerce a mediação para um saber sobre a
consciência-de-si, a solução dialética é a ressurgência do objeto
transfigurado, o que não é uma solução. O caminho é encontrar-se no objeto e
para isso a verdade da natureza e do universo deve estar na verdade do sujeito
e de sua história, ou seja, "a consciência-de-si alcança a sua satisfação
somente numa outra consciência-de-si".
Diferenciar-se do objeto é estabelecer a dialética do
reconhecimento e assim o desejo encontra sua verdade, pela diferenciação. Se
assim não for o objeto da pulsão é consumido na satisfação, ou é resinificado.
É então pensando sobre si mesmo, resinificando que o homem vive pela razão,
sublima os instintos e a consciência caminha para "a experiência do que é
o Espírito, essa substância absoluta que, na liberdade acabada e na
independência da sua oposição, a saber, de diversas consciências-de-si que são
para-si, é a unidade das mesmas; Eu que é Nós, e Nós que é Eu” (p. 77). Essa dialética do reconhecimento é o
que permite ao sujeito constituir-se em oposição ao outro, sem fusão, mantendo
sua individualidade, sua existência histórica e desvelar essa história
compreendendo de forma dialéticas as diversas interfaces, não só das
vicissitudes da vida, mas de seu desejo a medida que vai apropriando-se de
outra consciência-de-si e assim de si. Lacan fez várias incursões sobre o
Sujeito (consciência-de-si) e o objeto, vários esquemas, formulas, metáforas,
que merece considerações em outro momento. Mas que pode ser expressa na
seguinte metáfora: é na minha imagem que vejo refletida no olhar do outro, que
me encontro. Portanto, onde e como cada sujeito vê inscrito seu destino é um
enigma. Nessa luta do reconhecimento a racionalidade ética, deve percorrer um
caminho de busca de um saber que está dentro de si e que justifica sua
existência.
Referência
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