1 de março de 2013

Ética e Dignidade

“Age de tal modo que possas tratar sempre a humanidade, seja em tua pessoa, seja na do próximo, como um fim; não te sirvas jamais disso como um meio”. Kant 

Há que pontuar as transformações no significado das representações culturais: A existência do sujeito assume  mais que nunca, características de massa, onde  as subjetividades são ignoradas. Se para Kant faltava muito para a plenitude da liberdade e da racionalidade, que dizer dos dias atuais? Vemos grande parcela de indivíduos cuja condição ontológica não inclui a racionalidade, e aproxima-se da natureza primitiva, os fatos diários falam por si. Ao refletir-se sobre a representação do direito, através de suas instituições,  conclui-se em, Kant a posição dos sujeitos na sua “menoridade”, constituindo-se em “coisas humanas”, e que para conquistar sua “maioridade” deve exclui o medo das sombras e percorrer a natureza por baixo do envoltório, onde cada sujeito desenvolve o germe do pensamento livre. Este atua em retorno sobre a maneira de sentir, elevando-se mais do que ao simples animal, mas a “Ser Humano” de acordo com sua dignidade.

Apesar das máximas culturais muitas vezes colocarem-se de formas ascendentes, no que diz respeito ao direito e a moral, há que se ler que existe uma vontade, uma subjetividade nos indivíduos, determinada pela razão. A representação cultural por inúmeros objetos, dentre os quais a lógica repetitiva do modo de produzir, a cultura de que a legalidade é para legitimar a ilegalidade, possibilitando o embrutecimento social, onde todas as verdades estão nos “interesses corporativos”, leis de leis são aprovadas “para garantir direitos”, que representam a negação de leis morais (subjetivas). A tendência à atividade violenta é “trancado” onde a folga do ferrolho poderia acarretar o surto às tendências contraria a lei. A contradição da expectativa de que ao ser o que elabora e aplica a lei haveria por si só uma retribuição não se efetiva, pois estamos falando de indivíduos com interesses que podem ser aparentemente contraditórios, mas que se constitui o cerne do sujeito, “ele só quer garantir a posição dele, ou como dirá Lacan “o gozo”.
A existência da dignidade estaria em garantir a legalidade? A questão  que a dignidade, exige não somente o cumprimento da lei, mas constitui-se um valor ético e moral, que não deve ser razão para méritos. A razão prática enquanto fundamento que determina a vontade, tem consciência da necessidade do conceito de causalidade, ou seja, o conceito de liberdade e assim de dignidade. É neste ponto que a aplicação da lei, não considera o conceito de liberdade demonstrado por uma necessidade humana e sim necessidade de direito, do que está escrito. Se não existisse necessidade humana fora do direito, não seria possível existir lei moral, uma vez que a liberdade real se manifesta por meio da lei moral.  É desta forma que Kant fala na Crítica da Razão Prática “A liberdade é indubitavelmente a ratio essendi da lei moral, mas a lei moral é a ratio cognoscendi da liberdade...”. (P.14)

Como toda a concepção de moral assenta-se na “razão autônoma”, ou seja, na liberdade e autonomia, como compreender o sujeito enquanto sujeito da moral? Há que se pensar neste sujeito como reflexivo, em percurso do seu esclarecimento, com movimentos transformadores das inclinações, de forma que suas máximas sejam reflexos da pureza das intenções e possibilitem “imperativos categóricos”, de uma necessidade moral absoluta e ele seja assim, um sujeito da moral. Desta forma “A liberdade indiscutível afirmação da crítica especulativa é o sujeito pensante para si mesmo”.

Na força da razão está “a autonomia que é o princípio da dignidade da natureza humana e de toda natureza raciocinante”, ou seja, o fundamento da moral. Esta autonomia nada mais é que a “autonomia da vontade livre”, que deve ser livre de contingências, mas e se as contingências forem os interesses de quem aplica a lei? Ou seja, para ser uma vontade inteiramente boa é necessário que a razão pura prática deva ser movida pela moralidade. 

O exercício pleno do direito que deveria ser um “imperativo categórico” vê-se que a vocação de parte dos aplicadores tem sido representada por uma fragilidade no exercício jurídico. A política não dobra os “joelhos diante do direito”. Quando a política entra em conflito com a moral o exercício do direito é quebrado, pois para que este venha a ser plenamente realizado é necessário, que o conflito seja “superado”, que haja estabelecido um status moral e a prática do direito seja um reflexo da moral. Se o Estado não se representa enquanto um Estado de direito, as leis são exercidas de forma fragilizada e desta forma a liberdade a dignidade.

Há que se pensar na aplicação da lei de forma humanitária, como leis para as ações transformadoras, embora muitos deveres envolvam máximas, constituindo-se em deveres de virtude e assim imperfeitos, e seu cumprimento contingencial, nem sempre a legislação de deveres está incluída na ética, embora a ética possa englobar todo tipo de deveres. Como a máxima do arbítrio é determinada a priori pela lei do direito, de forma que a liberdade do sujeito “possa manter-se juntamente com a liberdade de qualquer outro segundo uma lei universal”, pois o dever estabelece uma relação intrínseca com a lei.

A concordância da liberdade de um indivíduo com a liberdade de todos, deve existir com o postulado da lei pública exterior, enquanto vontade unificada de todos segundo o princípio da igualdade, sem a qual não haveria liberdade para cada um. Desta forma “O direito nunca deve ser adaptado à política, muito menos aos interesses corporativos ou pessoais, mas estes é que devem ajustar-se ao direito”.  O direito, as leis, o direito à liberdade, ao uso público da razão, não é uma opção, mas deve ser o exercício da  força moral para que possam vir a ser razão pura prática, em que todos pudessem ser legisladores.  

REFERÊNCIA
KANT, Immanuel. Crítica da Razão Prática – 1788. Tradução de Bertagnoli, Afonso. 3ª edição. Edições e Publicações Brasil Editora S.A – S. Paulo 1959

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