AS
“MÁXIMAS” E O “IMPERATIVO CATEGÓRICO” - ENTRE O PÚBLICO E O PRIVADO
“Age
sempre como se a máxima da tua ação deverá ser erigida por tua vontade como uma
lei universal da natureza”.
“Age
de tal modo que possas tratar sempre a humanidade, seja em tua pessoa, seja na
do próximo, como um fim; não te sirvas jamais disso como um meio”.
É
certo que vivemos em uma sociedade em que os limites entre o público e o
privado são cada vez mais tênues, quando não inexistentes. Vemos nos meios de
comunicações às vidas sendo expostas de forma desagregada, no que diz respeito
à própria individualidade. Essa exposição não é da essência do ser em si, mas
do ser que é possível na sociedade do sucesso, não importa a que custo
subjetivo. Nesta sociedade não é mais a discussão entre o Ser e o Ter do
humanismo, do existencialismo, mas o parecer Ser e Ter. É o mundo virtual.
Basta parecer, não é preciso Ter, muito menos Ser. É na contramão dessa
construção que refletimos sobre a construção da estrutura do sujeito entre o
público e o privado e da “lei a priori” que
se dá por complexas determinações da sensibilidade e da razão a caminho do ser
moral. Então estamos falando de Kant e da distância da “máxima” ao “imperativo
categórico”, do subjetivo aos fatos do mundo, do privado ao público é a forma
como o sujeito se pensa representar nos objetos. O sujeito cujo trabalho deve
ser entendido como um acréscimo ao seu próprio bem-estar, o êxito desses como
seu maior patrimônio que se integra na vida particular de cada sujeito, sendo
os fatos, atos, verificados na conduta do dia-a-dia em sua vida privada
acrescido ou diminuído os seus bom conceito na vida profissional, colocando-o
sob a tutela disciplinar do Estado, ou Instituição, obscurecendo a realização
do uso prático de sua razão a se realizar enquanto lei
moral, liberdade. Para Kant a razão pura é prática e desta
forma imanente, ou seja, ela se realiza, mas pode ser patologicamente afetada:
“Admitindo-se
que a razão pura pode encerrar em si um fundamento prático, suficiente para a
determinação da vontade, então há leis práticas, mas se não se admite o mesmo,
então todos os princípios práticos serão meras máximas. Em uma vontade
patologicamente afetada por um ser natural pode observar-se um conflito das
máximas diante das leis práticas conhecidas pelo mesmo. Exemplo: alguém pode
adotar o axioma de não suportar qualquer ofensa sem vingá-la, compreendendo,
todavia que isso não constitui nenhuma lei prática, mas apenas a sua máxima e
que, de modo inverso, como regra para a vontade de todo ser racional, idêntica
máxima não pode concordar em si mesma”. (p.37-38)
Como a
razão na prática se ocupa da faculdade de desejar, prescrevendo a ação, que tem
um efeito, uma intenção, “síntese” de múltiplas determinações, o sujeito
formula princípios em si mesmo, conhecimento prático, determinando sua vontade,
que nem por isso constitui leis a que inevitavelmente esteja submetido. A razão
enquanto “imperativo”, um “dever ser”, de determinação da vontade, é distinta
das “máximas”, que constitui princípios subjetivos, determinando a “causalidade
de ser racional”. O que seria expresso do domínio privado ao domínio público,
poderia ser colocado como “imperativo hipotético”, as habilidades; ou seja, as
ações são boas em função de algo possível. O Estado e Instituições deveriam ser
um exercer o poder de corrigir o juízo dos profissionais sobre o valor das
ações que poderão executar como fins e assim evitar Estado e Instituições o
“deixa fazer”.
O que se
expressa do domínio público para o domínio privado seria sempre o “imperativo
categórico”, uma vez que são leis necessárias e independentes de condições
patológicas. O sujeito enquanto categoria, estruturado numa individualidade
racionaliza sua subjetividade, seus preceitos práticos, cuja vontade é
determinada somente como vontade, que visa apenas um efeito. É como
se não houvesse no percurso da razão as condições para o estabelecimento da lei
moral. O trem que possui um freio que o faz parar em todas as estações, não se
instalou então este dispositivo não se instala no sujeito. A vontade deve
manifestar-se no sujeito antes que este se pergunte se tem a capacidade
necessária para produzir um efeito desejado, de desejo, ou o que deve fazer
para produzir um “imperativo categórico”, um “dever ser”, para além da
legalidade do Estado e instituições.
É desta
forma que, segundo Kant, toda questão ética assenta na liberdade, ou seja, na
“razão autônoma”. A liberdade é liberdade para a lei, o “dever ser”. Nos
códigos de ética a liberdade está no “dever”, no “imperativo hipotético”,
constituindo o cumprimento dos deveres positivados e negativados. Kant fala da
liberdade como chave para autonomia da vontade:
“A vontade
é uma espécie de causalidade dos seres vivos, enquanto racionais, e liberdade
seria a propriedade dessa causalidade, pela qual ela pode ser eficiente, não
obstante as causas estranhas que possam determiná-la; assim como a necessidade
natural é a propriedade da causalidade de todos os seres irracionais de serem
determinados à atividade pela influência de causas estranhas”(p.79).
Para Kant,
esta condição de autonomia da vontade significa o desejar, o escolher máximas
que possam ser “leis universais”. Para tanto “seria necessário sair do
conhecimento dos objetos e passar a uma crítica do sujeito”, ou seja, como o
sujeito pensa que se representa como pensa que representa seus objetos
constitui um princípio moral. Nos códigos de ética a liberdade atribuída à
vontade está associada à vocação do Estado e instituições, aos deveres
positivados e negativados. Portanto não à “autonomia da razão”. Há que se
pensar que o sujeito (enquanto representante do Estado e instituições), quando
se faz representar nos seus vários objetos, adota pontos de vista diversos das
representações destes. E estas representações possibilitam a este sujeito
conhecer os objetos da forma como eles o afetam, não podendo ser conhecidos em
si mesmo, mas somente enquanto fenômenos e enquanto fenômenos pertencem ao
mundo sensível, mas é o conhecimento pertencente ao mundo inteligível, que
estrutura a lei e assim a liberdade, que está na essência entre o público e o
privado. O fato de a consciência ser afetada pelo conhecimento que o sujeito
tem de si o eleva enquanto inteligência. Como todas as ações humanas são de
causalidade e efeito, o que resulta em liberdade, nem por isso é desprovida de
leis naturais, morais, universais.
Referências
KANT,
Immanuel. Crítica
da Razão Prática – 1788. Tradução de Bertagnoli, Afonso. 3ª edição.
Edições e Publicações Brasil Editora S.A – São Paulo 1959.
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