1 de abril de 2013

Ética - Entre o Público e o Privado

AS “MÁXIMAS” E O “IMPERATIVO CATEGÓRICO” -   ENTRE O PÚBLICO E O PRIVADO

“Age sempre como se a máxima da tua ação deverá ser erigida por tua vontade como uma lei universal da natureza”.

 “Age de tal modo que possas tratar sempre a humanidade, seja em tua pessoa, seja na do próximo, como um fim; não te sirvas jamais disso como um meio”.  

       É certo que vivemos em uma sociedade em que os limites entre o público e o privado são cada vez mais tênues, quando não inexistentes. Vemos nos meios de comunicações às vidas sendo expostas de forma desagregada, no que diz respeito à própria individualidade. Essa exposição não é da essência do ser em si, mas do ser que é possível na sociedade do sucesso, não importa a que custo subjetivo. Nesta sociedade não é mais a discussão entre o Ser e o Ter do humanismo, do existencialismo, mas o parecer Ser e Ter. É o mundo virtual. Basta parecer, não é preciso Ter, muito menos Ser. É na contramão dessa construção que refletimos sobre a construção da estrutura do sujeito entre o público e o privado e da “lei a priori” que se dá por complexas determinações da sensibilidade e da razão a caminho do ser moral. Então estamos falando de Kant e da distância da “máxima” ao “imperativo categórico”, do subjetivo aos fatos do mundo, do privado ao público é a forma como o sujeito se pensa representar nos objetos. O sujeito cujo trabalho deve ser entendido como um acréscimo ao seu próprio bem-estar, o êxito desses como seu maior patrimônio que se integra na vida particular de cada sujeito, sendo os fatos, atos, verificados na conduta do dia-a-dia em sua vida privada acrescido ou diminuído os seus bom conceito na vida profissional, colocando-o sob a tutela disciplinar do Estado, ou Instituição, obscurecendo a realização do uso prático de sua razão a se realizar enquanto lei moral,  liberdade. Para Kant a razão pura é prática e desta forma imanente, ou seja, ela se realiza, mas pode ser patologicamente afetada:

“Admitindo-se que a razão pura pode encerrar em si um fundamento prático, suficiente para a determinação da vontade, então há leis práticas, mas se não se admite o mesmo, então todos os princípios práticos serão meras máximas. Em uma vontade patologicamente afetada por um ser natural pode observar-se um conflito das máximas diante das leis práticas conhecidas pelo mesmo. Exemplo: alguém pode adotar o axioma de não suportar qualquer ofensa sem vingá-la, compreendendo, todavia que isso não constitui nenhuma lei prática, mas apenas a sua máxima e que, de modo inverso, como regra para a vontade de todo ser racional, idêntica máxima não pode concordar em si mesma”. (p.37-38)

Como a razão na prática se ocupa da faculdade de desejar, prescrevendo a ação, que tem um efeito, uma intenção, “síntese” de múltiplas determinações, o sujeito formula princípios em si mesmo, conhecimento prático, determinando sua vontade, que nem por isso constitui leis a que inevitavelmente esteja submetido. A razão enquanto “imperativo”, um “dever ser”, de determinação da vontade, é distinta das “máximas”, que constitui princípios subjetivos, determinando a “causalidade de ser racional”. O que seria expresso do domínio privado ao domínio público, poderia ser colocado como “imperativo hipotético”, as habilidades; ou seja, as ações são boas em função de algo possível. O Estado e Instituições deveriam ser um exercer o poder de corrigir o juízo dos profissionais sobre o valor das ações que poderão executar como fins e assim evitar Estado e Instituições o “deixa fazer”.

O que se expressa do domínio público para o domínio privado seria sempre o “imperativo categórico”, uma vez que são leis necessárias e independentes de condições patológicas. O sujeito enquanto categoria, estruturado numa individualidade racionaliza sua subjetividade, seus preceitos práticos, cuja vontade é determinada somente como vontade, que visa apenas um efeito.  É como se não houvesse no percurso da razão as condições para o estabelecimento da lei moral. O trem que possui um freio que o faz parar em todas as estações, não se instalou então este dispositivo não se instala no sujeito. A vontade deve manifestar-se no sujeito antes que este se pergunte se tem a capacidade necessária para produzir um efeito desejado, de desejo, ou o que deve fazer para produzir um “imperativo categórico”, um “dever ser”, para além da legalidade do Estado e instituições.

É desta forma que, segundo Kant, toda questão ética assenta na liberdade, ou seja, na “razão autônoma”. A liberdade é liberdade para a lei, o “dever ser”. Nos códigos de ética a liberdade está no “dever”, no “imperativo hipotético”, constituindo o cumprimento dos deveres positivados e negativados. Kant fala da liberdade como chave para autonomia da vontade:

“A vontade é uma espécie de causalidade dos seres vivos, enquanto racionais, e liberdade seria a propriedade dessa causalidade, pela qual ela pode ser eficiente, não obstante as causas estranhas que possam determiná-la; assim como a necessidade natural é a propriedade da causalidade de todos os seres irracionais de serem determinados à atividade pela influência de causas estranhas”(p.79).

Para Kant, esta condição de autonomia da vontade significa o desejar, o escolher máximas que possam ser “leis universais”. Para tanto “seria necessário sair do conhecimento dos objetos e passar a uma crítica do sujeito”, ou seja, como o sujeito pensa que se representa como pensa que representa seus objetos constitui um princípio moral. Nos códigos de ética a liberdade atribuída à vontade está associada à vocação do Estado e instituições, aos deveres positivados e negativados. Portanto não à “autonomia da razão”. Há que se pensar que o sujeito (enquanto representante do Estado e instituições), quando se faz representar nos seus vários objetos, adota pontos de vista diversos das representações destes. E estas representações possibilitam a este sujeito conhecer os objetos da forma como eles o afetam, não podendo ser conhecidos em si mesmo, mas somente enquanto fenômenos e enquanto fenômenos pertencem ao mundo sensível, mas é o conhecimento pertencente ao mundo inteligível, que estrutura a lei e assim a liberdade, que está na essência entre o público e o privado. O fato de a consciência ser afetada pelo conhecimento que o sujeito tem de si o eleva enquanto inteligência. Como todas as ações humanas são de causalidade e efeito, o que resulta em liberdade, nem por isso é desprovida de leis naturais, morais, universais. 
Referências
GIOVANNI, Reale, ANTISERI, Dario. Historia da Filosofia: Do humanismo a Kant. 1990 São Paulo- Edições paulinas.
KANT, Immanuel. Crítica da Razão Prática – 1788. Tradução de Bertagnoli, Afonso. 3ª edição. Edições e Publicações Brasil Editora S.A – São Paulo 1959.
 KANT, Immanuel. Textos Seletos - Prefácio Primeira Edição da Crítica da Razão Pura -1781- Editora Vozes 1974. 

Nenhum comentário: